Entrevista com Dr Homero P. Vallada Filho

O transtorno afetivo bipolar tem um componente hereditário?

Um dos principais fatores que contribuem para o desenvolvimento do transtorno bipolar é o comprovante genético. Essa afirmação se baseia nos estudos epidemiológicos sobre famílias, gêmeos e adotivos.

Nos estudos sobre famílias observou-se que parentes de 1grau (são aqueles parentes que apresentam 50% de genes em comum, por exemplo, pais, irmãos ou filhos)de pacientes com transtorno bipolar apresentam um risco aumentado para também desenvolver a doença quando comparados a indivíduos da população geral, esse risco pode chegar a 8%, ou seja , um risco quase 10 vezes maior quando comparado ao de uma pessoa que não tem parentes com transtorno bipolar.

Mas a agregação familiar é necessariamente uma causa genética?

Não. A demonstração do caráter familiar é necessária, mas não suficiente para comprovar a transmissão genética, haja vista que essa agregação na família pode ser decorrência da mesma exposição ambiental (por exemplo, verminose). Assim, estudos sobre gêmeos e adotados são necessários para identificar a fonte dessa concentração familiar.

Os estudos sobre gêmeos comparam a comparam a concordância para a doença entre gêmeos monozigóticos (MZ) à concordância observada entre gêmeos dizigóticos(DZ).

Entretanto, gêmeos MZ são geneticamente idênticos (um é clone do outro),enquanto os DZ compartilham apenas a metade de sua carga genética( 50%dos genes em comum).Desse modo, em doenças determinadas pelo ambiente, a concordância entre MZ e DZ seria próxima, ao passo que em doenças genéticas a concordância nos MZ seria significativamente maior que nos DZ e tenderia a se aproximar de 100%. Nos estudos publicados na literatura médica, apresentam uma taxa de concordância para o transtorno do humor duas a quatro vezes maior em gêmeos MZ do que nos DZ, Reforçando a hipótese de um componente genético nessa enfermidade. De outro lado, observa- se também que o componente genético não é o único determinante desse transtorno, pois nesse caso a concordãncia entre os gêmeos MZ seria de 10%(nos estudos sobre bipolares a concordãncia é por volta de 70% a 80%.


Mas os estudos sobre gêmeos MZ e DZ partem da premissa de que os dois tipos de gêmeos sofrem influência ambiental semelhante, mas não é bem isso que observamos.

É verdade, gêmeos MZ (também chamados de gêmeos idênticos) são tratados de forma mais semelhante do que irmão DZ(também chamados de gêmeos fraternos),sendo essa uma possibilidade para justificar as diferentes taxas de concordância apontadas por alguns críticos. Com o intuito de separar por completo a influência do ambiente do componente genético, utiliza-se a estratégia de investigação da doença em adotados.
Esses estudos têm basicamente dois desenhos principais: no primeiro, investiga-se a frequência da enfermidade entre os pais biológicos e os pais adotivos de crianças adotadas que vieram a desenvolver a doença: no segundo, observa-se a frequência do distúrbio nos filhos biológicos de portadores da doença que foram adotados ao nascimento e compara-se a filhos biológicos de pais saudáveis que também foram adotados logo após o nascimento. Naturalmente esses estudos são muito difíceis de ser executados, não só pelas questões éticas que eles envolvem, mas também porque exigem bons serviços de adoções. Apesar do número limitado de investigações com adotados ,esses estudos são consistentes com a presença de um componente genérico na determinação dos transtornos bipolares.

Podemos então concluir que os tipos de estudos apresentados acima demonstram a existência do componente genético para o transtorno bipolar .O que tem-se feito atualmente na área na área de genética do transtorno bipolar?

Uma vez demonstrada a existência do componente genético, o próximo passo é identificar precisamente quais seriam esses genes.

A Unidade de Genética do Laboratório de Neurociências do Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo tem realizado vários estudos na área de genética molecular na procura desses genes.

Além disso, estamos também trabalhando na identificação de genes associados com a resposta terapêutica aos medicamentos.
Isto é, estamos investigando as variantes genéticas que contribuem para melhor resposta ao tratamento usando este ou aquele antidepressivo ou este ou aquele estabilizador do humor.

Prof. Dr. Homero Pinto Vallada Filho
Professor associado do departamento de Psiquiatria da FMUSP
E-mail: hvallada@usp.br

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