Doença Depressiva e Estigma

A ABRATA entrevista:
Dra. Denise Gama – Médica Psiquiatra

Dra. Giuliana Cividanes – Mestre em psiquiatria
Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP

O termo depressão tem sido usado para descrever uma alteração do estado emocional e físico das pessoas desde tempos remotos. Um sinônimo de depressão era usado inicialmente para descrever essas alterações: a palavra melancolia. Quem já não ouviu falar: “Ah! Fulano é muito melancólico!”, referindo-se a pessoas constantemente tristes?

Hoje em dia o termo depressão popularizou-se. Fala-se de depressão nas revistas femininas, nas novelas, nas conversas com amigos e vizinhos e em outros meios de comunicação. A palavra tem sido usada para designar tristeza ou incapacidade para fazer algo num determinado momento. Mas será que é isso que os médicos e outros profissionais da saúde mental querem dizer quando falam de depressão?

Muitas vezes não. Para a medicina o termo depressão é usado para falar de uma doença. Depressão não é apenas uma emoção. É uma doença que afeta o corpo como um todo e pode trazer conseqüências indesejáveis à vida do indivíduo acometido.

Estudos mostram que a depressão afeta indivíduos de todas as raças e idades, em todas as partes do mundo.

A freqüência com que a depressão pode afetar as pessoas é muito alta. Estima-se que de 15% a 25% das pessoas irão apresentar uma fase depressiva pelo menos uma vez em suas vidas.

A depressão é um grande problema de saúde pública, tanto pela sua freqüência quanto pela possibilidade de afetar os relacionamentos sociais, familiares, de trabalho e a qualidade de vida. Os custos diretos (com elaboração de políticas de saúde adequada, custos do tratamento para o paciente e para os sistemas de saúde) e indiretos (como perda da capacidade de trabalho) levam a um grande prejuízo.

Nos Estados Unidos da América, estima-se que a depressão corresponda a 75% de todas as hospitalizações psiquiátricas. Segundo alguns autores, isso significa um custo de 0,3 a 0,9 bilhões de dólares por ano.

Mas de onde vem a depressão?

Não sabemos ao certo ainda de onde a depressão vem. Provavelmente a combinação de muitos fatores leva à depressão. O que se sabe hoje é que provavelmente há um componente hereditário envolvido no aparecimento da depressão. Pessoas com depressão geralmente têm parentes que sofrem da mesma doença.

Sabemos também que na depressão as pessoas doentes apresentam alterações biológicas, ou seja, várias evidências sugerem que há alterações na regulação do funcionamento dos neurotransmissores (substâncias químicas que funcionam como “mensageiros” no sistema nervoso central).

Fatores de vida estressantes, outras doenças físicas, uso de certos medicamentos, álcool e drogas também podem contribuir para o aparecimento do quadro.

Quais queixas e sinais devem ser observados?

Sintomas persistentes de tristeza e desesperança podem apontar para uma suspeita de depressão, em contraste com a reação emocional de tristeza em situações vivenciais.

A depressão afeta o humor, o pensamento, as funções corporais e o comportamento. O humor pode estar persistentemente triste, melancólico, mas podem surgir também queixas de irritabilidade ou “sentimento de incapacidade de sentir emoções”. Queixas de dificuldade para sentir prazer também são freqüentes.

O pensamento em geral é negativo, com ideação de culpa, incapacidade, baixa auto-estima e pessimismo exacerbado. Freqüentemente a concentração diminui e há dificuldade para tomar decisões Podem surgir pensamentos de morte e de que a vida não vale mais a pena.

As funções corporais também estão afetadas: desânimo e falta de energia são queixas comuns. Podem surgir alterações da movimentação, com lentificação ou agitação. Alterações do apetite são freqüentes, com inapetência e perda de peso. Alguns podem apresentar queixas opostas, com aumento de apetite. Freqüentemente o sono encontra-se alterado, com despertar precoce, sono entrecortado ou dificuldade para iniciar o sono. Alguns apresentam quadro inverso, com sono excessivo. O desejo sexual encontra-se diminuído em muitos casos.

Mudanças de comportamento incluem isolamento social, dificuldades de convívio familiar e de trabalho.

Em situações mais graves os cuidados básicos de alimentação e higiene ficam comprometidos.

Muitas dessas pessoas não procurarão tratamento adequado. Por que isso acontece?

Diversos fatores podem ser apontados, mas sem dúvida alguns dos mais importantes são: falta de informação sobre a doença e o estigma relacionado à depressão.

Um fator que habitualmente retarda ou inviabiliza a busca de tratamento é o estigma. Muitas vezes a doença é avaliada pela família ou ambiente de convívio social e de trabalho como preguiça, fraqueza e até mesmo defeito de caráter. Nas situações de trabalho o indivíduo se defronta com incompreensão, avaliação negativa. Isso certamente retarda a procura de um profissional de saúde para uma avaliação completa e indicação de tratamento.

Nas situações familiares muitas vezes nota-se a crença de que a melhora pode depender de estímulos ou “mudança de vida”. A melhora da depressão depende certamente de um tratamento adequado, não de força de vontade.

Como uma sociedade, somos bombardeados diariamente com informações sobre pessoas com doenças mentais.

A mídia e os veículos de informação muitas vezes caracterizam estas pessoas como incapazes, com “desvios de conduta”, imprevisíveis.

Este fato pode trazer conseqüências trágicas.

Muitas pessoas com problemas mentais não procuram tratamento por vergonha associada à doença. A maioria tem uma expectativa de alguma forma de discriminação no ambiente de trabalho e em situações sociais.

O tratamento pode mudar radicalmente a qualidade de vida do indivíduo, incluindo diferentes estratégias: tratamento medicamentoso, psicoterapia e outros.

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